quarta-feira, 23 de junho de 2010

Isso é jornalismo?

O destaque, o furo, a disputa pela audiência transformaram os veículos de comunicação em concorrentes que acima de tudo buscam público a qualquer preço.
Casos de morte transformam-se em novelas que podem durar meses. Um exemplo é o programa do Datena que explora tragédias, expõe familiares de vítimas de forma sem sentido. Repórteres entram no ar ao vivo para mostrar uma senhora chorar desesperada sem ao menos conseguir falar.
O jornalismo transformado em show, atualmente com a convergência de mídias tudo é transmitido e nada passa em branco.Segundo Domenique Wolton, atualmente vive-se a tirania da do instante, e a solução para esta overdose de informações seria abrandar, em vez de acelerar, organizar e racionalizar, em vez de aumentar os volumes de informação, introduzir intermédios, em vez de suprimir, regulamentar.
Ainda de acordo com Wolton, os ideais tornaram-se caricaturas, existe um defasamento entre os ideais da informação e a realidade.
A entrevista de Monica Lewinsky a Barbara Walters mostra o quanto o próprio consumidor da informação quer saber sobre futilidades. Do contrário saber detalhes sobre a intimidade de Monica Lewinsky com o então presidente Bill Clinton, não teria tido tamanha repercussão.
Douglas Kelner discute a cultura das mídias e define as pessoas como as que pensam e as que não pensam. O que entende-se na questão do bombardeio de informações é que embora os veículos passem o que querem, o consumidor tem a opção de aceitar ou não aquilo que vê, ouve, lê ou assiste.
Mesmo que o consumidor de mídia tenah a opção de escolher o que consome a questão é qual o futuro do jornalismo? Por que, mesmo com muitos veículos, sejam rádios, sites, programas de televisão, todos se assemelham e tratam a informação com ângulos iguais?
Não basta a informação nua e crua, é necessário para um jornalismo do futuro uma renovação que pudesse trazer de volta a qualidade da informação, além dos fatos, análises, outros ângulos e pontos de vista.
A convergência de mídias possibilita os amadores a sentirem-se no mesmo patamar dos profissionais, então a informação apurada, investigada é disseminada em milhares de blogs com o ponto de vista dos autores, fato é, que se o próprio veículo formal de comunicação já não é mais tão qualificado, o que esperar de quem ainda recorta o fato e ilustra em uma página de internet?
As crises do jornalismo afetam economicamente, politicamente e tecnicamente, os donos dos veículos são empresários e não jornalistas, pensam em ganhar dinheiro e não em informar com qualidade.
A busca pela audiência trouxe ao jornalismo mais publicidade, os jornais, revistas, sites, programas são um mix de bombardeio informacional com merchandising.
O espetáculo é o que importa, saber onde Bill Clinton praticou sexo com Monica Lewinsky é mais importante do que saber que ocorreu um terremoto no Japão.
Quem faz a notícia? Quem escolhe? Os jornalistas em geral dominam técnicas que possibilitam informar com qualidade, técnicas que podem transformar um fato em debate público, podem mudar a opinião das pessoas. Deveriam mudar o mundo, ao menos deveriam tentar mudar.
A sociedade capitalista consegue corromper o fato mais defasado da imprensa: a liberdade de expressão. O poder domina os veículos, e o poder quer ganhar dinheiro, o jornalista paga um preço caro por isso, escreve, apura, busca fatos novos e no fim o que sobra para o consumidor de mídia?
Seria culpa dos administradores e diretores? Ou do público que consome sem questionar?
Tanto se fala sobre o jornalismo atual, mas pouco se faz. Investidores estão em todo lugar, num dia são acionistas com poder de decidir em uma grande redação, se não der certo no outro dia o mesmo acionista do veículo de comunicação torna-se o investidor de uma empresa de salsichas enlatadas. Ou seja, o dinheiro define. O jornalista é mera ferramenta de trabalho para dar audiência, poderia ser tratado como uma marionete dos poderosos.
O curioso disso tudo é que o mesmo jornalista que cobre uma guerra, tempos depois pode estar ao vivo no ar para mostrar a dona Maria que acaba de saber que o filho foi assassinado por traficantes...E conta para ela no ar, para a mãe que perdeu o filho e para todo o país. Deve ouvir o diretor ao pé do ouvido: Filma ela chorando... Isso é jornalismo?

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